
"As empresas vivem numa busca frenética para conquistar os talentos humanos. Só que quando esses fazem parte de suas equipes, surge uma grande dúvida: como retê-los. Para isso, muitas organizações recorrem a salários atraentes e uma série de benefícios que podem garantir até mesmo a melhoria da qualidade de vida do profissional. Mas, mesmo diante de tantas vantagens oferecidas, chega um momento em que o talento decide ir embora e para a surpresa da organização, aquele profissional aceitou um convite de outra empresa, mesmo para receber uma remuneração inferior. Por que estamos perdendo nossos melhores profissionais?, perguntam os dirigentes. A resposta pode ser encontrada em vários fatores como, por exemplo, falta de reconhecimento pelo trabalho desenvolvido ou mesmo um nível de estresse insuportável, gerado pela constante pressão na busca de resultados imediatos. Para falar sobre retenção e perda de talentos humanos, o RH.com.br entrevistou Juscimara Cardoso, consultora empresarial e educadora com experiência em ações destinadas ao desenvolvimento humano. "Infelizmente, a maioria das organizações não tem consciência acerca da importância do capital humano para sua permanência no mercado e sucesso", afirma. Se a perda de talentos na sua empresa é uma constante, essa entrevista poderá ajudá-lo a refletir melhor sobre o assunto e, quem sabe, encontrar soluções. Boa leitura!
RH.com.br - Atualmente, qual a importância do capital intelectual para as empresas que desejam manter-se competitivas?
Juscimara Cardoso - Considero o capital intelectual, prefiro dizer capital humano, o maior patrimônio das empresas. Sob esse prisma, as empresas que não estiverem irrestritamente atentas a esse capital estarão cavando o próprio túmulo. As pessoas têm de se sentir respeitadas no exercício de suas atividades profissionais. Isso é o mínimo que uma empresa tem de se propor a fazer. Brinco dizendo que se todas as pessoas cruzarem os braços, os computadores de última geração farão pirraça como uma criança mimada e não trabalharão. Apesar de ser uma brincadeira, expressa a verdade corporativa, quando os colaboradores não cumprem efetiva e satisfatoriamente seus papéis na organização, comprometem a produtividade, a competitividade, a lucratividade e a permanência da empresa no mercado. Então, é preciso criar um ambiente propício para que eles não cruzem jamais os braços, nem permitam que seu intelecto pare de funcionar.
RH.com.br - Além de enfrentar as constantes mudanças, as empresas precisam lidar com outra séria preocupação: a retenção de talentos. Quais os principais motivos que têm levado os profissionais a trocarem de empresa com tanta facilidade?
Juscimara Cardoso - O estresse originado pela pressão diária que muitas vezes deixa de ser producente e se torna agressiva demais, ultrapassando os limites do bom senso e da ética, é causa da perda de talentos ou anorexia corporativa que é conseqüência, também, do não investimento no patrimônio humano. A não valorização, o não reconhecimento, o desrespeito ao profissional, a inviabilidade de encarreiramento e crescimento profissional, entre outras atitudes comuns às organizações de todos os portes e segmentos provocam a busca de novas oportunidades no mercado.
RH.com.br - Dentre os motivos que a Sra. acabou de citar, qual aquele que mais tem estimulado o profissional a buscar um novo desafio profissional?
Juscimara Cardoso - O desrespeito somado à desvalorização. Profissionais que se sabem capazes não se submetem a essa realidade ou se submetem enquanto buscam paralelamente uma nova oportunidade.
RH.com.br - A não valorização, a falta de oportunidades de encarreiramento e o crescimento profissional são fatores que têm influenciado o turnover nas empresas. As organizações não estão sabendo lidar com esse problema ou ainda não despertaram que esse fato pode afetar a saúde corporativa?
Juscimara Cardoso - Acredito que, infelizmente, a maioria das organizações não tem consciência acerca da importância do capital humano para sua permanência no mercado e sucesso. Percebo em reuniões com executivos, com poder de decisão, que as empresas não enxergam o desenvolvimento de seus talentos como investimento, claro que há muitas exceções, existem empresas que investem alto em pessoas e têm sucesso no mercado. Às empresas cabe promover esse ambiente propício que dá condições a ela e aos seus colaboradores de se descobrirem e de viabilizarem a mútua cooperação. As empresas estão excessivamente preocupadas com sua saúde financeira, abandonando a verdade de que a saúde corporativa é o todo e a financeira apenas parte dessa totalidade que inclui as pessoas.
RH.com.br - Mudar de empresa tornou-se uma característica do profissional contemporâneo?
Juscimara Cardoso - Não. Mudar de empresa tornou-se uma característica de pessoas que buscam algo que realmente possibilite seu crescimento. O mercado, como o mundo, é dinâmico, estar estático pode significar deixar as oportunidades passarem e não aproveitá-las. Percebo que profissionais arrojados e que têm visão, desejam o crescimento, estão em busca do novo, mesmo que essa busca signifique dar alguns passos para trás, para, num futuro próximo, dar um passo para frente, porém um passo promissor, ousado, viabilizador de sucesso. Recuar é, também, uma forte estratégia humana.
RH.com.br - O que mais os profissionais procuram quando vão em busca de uma nova colocação: qualidade de vida ou uma melhor remuneração?
Juscimara Cardoso - Inicialmente, podem ser fortemente influenciados pela possibilidade de uma melhor remuneração. Num segundo momento, percebem que a qualidade de vida é indispensável para que tenham, inclusive, êxito profissional. Mas o que significa qualidade de vida? Isso pressupõe determinação, disciplina, habilidades diversas as quais podem ser desenvolvidas pelas empresas junto ao seu capital humano, através de atividades diversificadas. Sou a favor de programas de remuneração variável por performance. Penso que salário fixo, certinho todo mês, causa o ócio, a desmotivação, a improdutividade. Deve haver um fixo, mas o que deve fazer os olhos dos profissionais brilharem é a possibilidade de ter, além, do fixo, um variável que o possibilite realizar sonhos, conquistas. Em contrapartida, essa viabilização de sonhos e conquistas deve estar atrelada à produtividade, à criatividade, ao comportamento empreendedor de modo geral.
RH.com.br - Que conseqüências a alta taxa de turnover pode causar à empresa?
Juscimara Cardoso - Perda da capacidade produtiva e da qualidade, com conseqüente queda da lucratividade. Perda de talentos os quais podem contribuir para que a empresa obtenha êxito em suas ações de mercado. Contaminação de pessoas, devido à falta de interesse e motivação daqueles que desistem e buscam novas oportunidades de trabalho. Comprometimento da credibilidade organizacional. Comprometimento da saúde financeira da empresa, considerando que a rotatividade de profissionais gera custos diversos, além de outras conseqüências as quais podem levar uma empresa a sair de cena.
RH.com.br - A saída constante de profissionais pode afetar o clima interno e gerar "sintomas" como o estresse?
Juscimara Cardoso - Pode, acredite. O clima organizacional é afetado facilmente, seja de modo positivo ou negativo. Qualquer acontecimento pode resultar em motivação ou desmotivação, em trabalhos memoráveis, verdadeiros sucessos ou fracassos arrasadores. É uma engrenagem, a interdependência é real. A saída constante de profissionais pode sinalizar que algo na empresa não está bem, o que resulta num clima desfavorável, podendo funcionar como fonte de estresse.
RH.com.br - A Sra. poderia listar, pelo menos, umas cinco ações que podem evitar a perda de talentos humanos?
Juscimara Cardoso - Claro. Muitas são as atividades que podem ser implementadas pelas empresas em sua rotina a fim de evitar todos os males causadores e causados pela anorexia corporativa, entre elas estão a realização de treinamentos indoor e outdoor, bem como palestras, eventos, além de atividades que reduzem e - muitas vezes - eliminam algumas das várias fontes de estresse, tais como atividades recreativas, ginástica laboral, massoterapia, entre outras. O importante é ter - como resultado - empresa, colaboradores, fornecedores, parceiros e clientes felizes, satisfeitos com os resultados. Todos buscam, incansavelmente, soluções para seus problemas e dificuldades. Necessidades precisam ser satisfeitas e expectativas precisam ser superadas. O sucesso tem de ser uma garantia, mas somente é real quando acontece, efetivamente, e engloba todas a partes envolvidas.
RH.com.br - Essas ações podem ser aplicadas em qualquer empresa?
Juscimara Cardoso- Certamente. Ações que promovem o desenvolvimento humano e o progresso intelectual podem e devem ser implementadas em organizações de todos os segmentos e portes, a única condição é que ali haja pessoas.
RH.com.br - Que conselhos a Sra. daria para um profissional de RH que enfrenta perdas constantes de talentos internos?
Juscimara Cardoso - Você sabe: se conselho fosse bom, seria vendido. É difícil aconselhar, orientar sem conhecer a realidade, as necessidades e as expectativas das organizações, porém, como consultora em desenvolvimento humano e educadora corporativa, me sinto à vontade para dizer que os profissionais envolvidos em ações que visam ao capital humano nas empresas devem estar atentos às suas carências pessoais e profissionais. Também é necessário desenvolver uma capacidade de olhar e enxergar o outro verdadeiramente. Isso falta às pessoas e às empresas de modo geral.
RH.com.br - E onde parou essa capacidade humana de enxergar o próprio verdadeiramente?
Juscimara Cardoso - A percepção está empobrecida e, por isso, comprometedora. Basta olhar, estar atento, sentir o clima, ouvir as pessoas, conhecê-las, descobrir o que é preciso para que se transformem em talentos promissores, em profissionais aliados à empresa com a qual trabalha, co-labora. A expressão "cutucar a onça com vara curta" pode ser aplicada da seguinte maneira. É preciso cutucar talentos adormecidos e potencializá-los transformando-os em construtores e multiplicadores de sucessos. Receita de bolo? Isso não há mesmo, mas é preciso por a mão na massa. O tempo da colheita artesanal do café acabou, não precisamos de homens fortes com enormes mãos, precisamos de cabeças pensantes, pessoas que saibam refletir, analisar, calcular e assumir riscos de modo ético e responsável, aceitar e vencer desafios, conhecer e superar limites próprios, criar alternativas, pessoas e profissionais que queiram ser e sejam sucesso até quando suas ações não tenham o êxito almejado. "
Patrícia Bispo
Jornalista responsável pelo conteúdo da comunidade virtual RH.com.br.